Antes de fazer qualquer abordagem sobre este Livro, é importante atender aos seguintes esclarecimentos:
1. O Cântico dos Cânticos é uma parte inseparável do Cânon das Escrituras Sagradas, inspirado pelo poder do Espírito Santo, e, portanto, igualmente próprio para a nossa edificação espiritual.
2. Os doutores judaicos do Antigo Testamento nunca questionaram a sua canonicidade, e nem estranharam a sua linguagem alegórica, sempre ensinando que este Livro tem uma única mensagem central: O relacionamento que Deus mantém com o seu povo redimido.
3. O contexto deste Livro é o povo de Israel, a Igreja visível do Antigo Testamento. Esta Igreja era composta de uma multidão mista, Ex.12:38. “Donzelas”, membros que amam a Cristo e são comprometidos com Ele; e, as “filhas de Jerusalém”, membros descomprometidos, que questionam a importância singular de Cristo. “Que é o teu amado mais do que outro amado?” Ou, na linguagem do Novo Testamento, “virgens prudentes” que zelam por sua espiritualidade; e, “virgens nécias” que não se preocupam com a sua vida espiritual, Mt.25:1-13. A parte inconstante tem a tendência de irar-se contra os perseverantes fiéis. “Como, porém, outrora, o que nascera segundo a carne perseguia ao que nasceu segundo o Espírito, assim também agora”. Abraão foi o pai destes dois irmãos. Gal,4:22, 29.
4. A linguagem poética deste Livro também é encontrada em outras partes da Bíblia. Às vezes, Deus se autodenominava como “Marido” de Israel; e este povo como a sua “desposada”. “Como o noivo se alegra da noiva, assim de ti se alegrará o teu Deus” Is.54:5; 62:4-5. No Novo Testamento, este relacionamento nupcial fica ainda mais claro. Cristo é representado como sendo o “Noivo” da sua Igreja; e a Igreja como “virgem pura a um só esposo, que é Cristo” Mt.25:1; 2 Co.11:2. A melhor chave para o Livro Cântico dos Cânticos é o Salmo 45, cuja linguagem se assemelha a várias partes deste Livro.
5. Rejeitamos a teoria moderna que ensina que Salomão está descrevendo o seu namoro com uma das suas muitas mulheres. Este tipo de comparação já desvirtuou a espiritualidade de outras partes alegóricas das Escrituras Sagradas, procura fazer a mesma nulificação aqui. A linguagem deste Livro é tão sublime e espiritual, que ultrapassa qualquer experiência comunicativa entre homem e mulher. Através desta parte da revelação divina, entramos nos próprios arcanos celestiais, onde ouvimos as descrições mais santas daquela comunhão espiritual que existe entre Cristo e a sua Igreja.
6. Este Livro é uma alegoria, ilustrando graficamente a natureza desta comunhão espiritual. Com esta forma literária, o escritor emprega figuras ou representações para estabelecer e inculcar verdades de suma importância. A Bíblia contém muitas alegorias, cânticos e poemas, e, como formas literárias, são meios poderosos para memorizar as verdades representadas. Por exemplo, no Antigo Testamento, Cristo a vista como um “Renovo”, e a Igreja, como uma “árvore plantada junto à corrente de águas”. O Profeta Samuel usou uma alegoria dramática para convencer Davi de seu pecado; e esta o deixou lacerado no coração e arrependido, Le.4:1; 51.1:3; 2 Sm.12:1-15. O Livro de Cantares a um cântico, escrito em linguagem poética, usando palavras pitorescas para intensificar o assunto que está sendo apresentado. Neste poema, Cristo descreve a beleza da sua Igreja, afirmando que ela é “aprazível como Jerusalém, formidável como exército com bandeiras”. E a Igreja, por sua parte, descreve a singularidade de Cristo, dizendo que Ele é “alvo rosado, mais distinguido entre dez mil”. Não é preciso muita explicação para sentir o impacto que estas figuras podem causar sobre as nossas meditações cultuais.
7. Este Livro é composto de “Quadros pintados com palavras alegóricas”, portanto, ao interpretar cada “quadro”, deve se fazer uma pergunta: O que estas palavras estão querendo comunicar? E esta oração é de igual importância: “Desvenda os meus olhos, para que eu contemple as maravilhas da tua lei”, ou seja, do Livro, Cântico dos Cânticos. Assim, quando lemos este Livro, que possamos contemplar Jesus Cristo como Esposo, Senhor, Cabeça e Salvador de seu povo; bem como a Igreja, a sua esposa, o fruto do seu sofrimento vicário, aquela que é agora, “gloriosa, sem mácula, nem ruga, nem coisa semelhante, porém, santa e sem defeito” Ef.5:27.
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