Vasos de Honra

quarta-feira, 20 de abril de 2016

A VIDA DE JOSÉ




Leitura Bíblica:  Gênesis 37:1-11.

Introdução: A história de José é uma das mais gráficas e instrutivas de todas do Antigo Testamento. Qual foi a característica mais dominante nesta vida singular? Creio que seja o seu temor de Deus. Vemos esse distintivo dirigindo-o na sua menoridade, na sua mocidade e na sua maturidade.

Como podemos definir “o temor de Deus”? A pessoa que teme a Deus crê que Ele existe e que é santo, é justo e, por isso, “estabeleceu um dia em que há de julgar o mundo com justiça, por meio de Jesus Cristo, que destinou e acreditou diante de todos, ressuscitando dentre os mortos” (Hb. 11:6; At. 17:31); e, acreditando nessas duas  verdades, sabe que tem que viver uma vida “santa e irrepreensível” (Ef. 1:4). Por outro lado, a pessoa que não teme a Deus, diz em seu coração: “Não há Deus” (Sl. 14:1); não acredita que “cada um de nós dará contas de si mesmo a Deus” (Rm. 14:12); por isso, sente-se  livre para seguir todas as inclinações de seu próprio coração empedernido. “Corrompem-se  e praticam abominações; já não há quem  faça o bem” (Sl. 14:1). Em Romanos 3:10-17, temos uma lista de pecados impiedosos. Como podem existir tais atrocidades na vida do ser humano? O V.18 responde: “Não há temor de Deus diante de seus olhos”. No Salmo 36:1-4, por que o Salmista concluiu que certas pessoas não temiam a Deus? Por causa do seu procedimento. “Porque a transgressão o lisonjeia a seus olhos e lhe diz que a sua iniqüidade não há de ser descoberta, nem detestada” (Sl. 36:2).

Sabemos que o temor de Deus normalmente entra na vida de uma pessoa mediante o seu contato com a Palavra de Deus e a influência de parentes piedosos. José nasceu no meio da família de Labão, com quem o seu pai trabalhava. Ainda na sua infância, Jacó, seu pai, juntamente com a sua família e possessões, voltou para Canaã e para a casa de seu pai, Isaque. Embora a Bíblia não nos dê detalhes explicitamente, cremos que José passou a viver em contato constante com Isaque, o seu avô piedoso, e dele recebeu os princípios do temor de Deus. É muito instrutivo descobrir as semelhanças entre Isaque e o seu neto, José.

Em termos práticos, como podemos comunicar o  temor de Deus a nossos filhos? Quando batizamos os nossos filhos, prometemos diante de Deus e dos membros congregados na Igreja: “ensinar-lhes a ler para que venham a ler por si mesmos a Santa Escritura; orar por eles e com eles; servir-lhes vós mesmos de bons exemplos de piedade e religião, esforçar-vos por todos os meios designados por Deus para criá-los na disciplina e correção do Senhor”. Não é suficiente contar-lhes as histórias da Bíblia; temos que explicar quais são as doutrinas principais e o sentido bíblico do temor de Deus.

Como podemos cumprir as nossas obrigações espirituais e as promessas solenes que assumimos diante do Senhor? A maneira mais acessível é a prática diária do Culto Doméstico, com a família toda reunida para cantar hinos apropriados, ler as Escrituras Sagradas e orar uns pelos outros. Dessa maneira, os filhos sentirão e experimentarão a realidade de nossa “piedade e religião”. O temor de Deus não nasce por acaso, esse distintivo é inculcado mediante o devido uso dos meios da graça, a saber, pelas Escrituras Sagradas, oração e o exemplo pessoal dos pais e dos avós. Como Isaias disse: “Porque é preceito sobre preceito; regra sobre regra, regra e mais regra; um pouco aqui, um pouco ali” (Is. 28:10). Vamos descobrir como o temor de Deus atuava na vida diária de José.

1. Os Anos de Menoridade – até aos 17 anos. Nesta fase da vida de José, a Bíblia registra quatro incidentes nos quais podemos sentir que o temor de Deus já estava determinando a natureza de suas disposições.

a)      A moralidade de José. Quando tememos a Deus, nós nos sentimos ofendidos pela audácia do pecado. Não sabemos quais foram os pecados específicos de seus irmãos,  mas sabemos que o senso moral de José o constrangeu a reagir. Por ser ainda um menor, ele não tentou repreender os seus irmãos, que eram bem mais velhos, contudo, sentiu que algo devia ser feito. Ele relatou tudo  a seu pai, na esperança de que ele pudesse dar a devida repreensão, (Gn. 37:2).
b)      José, o filho preferido. Jacó derramou um amor maior sobre José, porque ele foi o primogênito de sua esposa favorita, Raquel e, também, por ser o filho de sua velhice, (Gn 37:3). José não tinha nenhuma culpa por ser o preferido de seu pai. Cremos que esse favoritismo não prejudicou o seu temor de Deus, antes, talvez o fortaleceu, porque não quis decepcionar a confiança de seu pai. Jacó ostentou a sua preferência por José dando-lhe uma “túnica talar de mangas compridas”, e, fazendo assim, provocou o ódio de seus irmãos. Mas, tudo índica que José, na sua ingenuidade, nunca percebeu esse ódio. Ele amava a seus irmãos e nunca questionou a lealdade deles, (Gn. 37:3-4).
c)      Os sonhos de José. Por causa de seu temor de Deus, José praticava uma comunhão espiritual com  seu Criador. Por meio de sonhos, Deus lhe revelou que, de alguma maneira, ele seria privilegiado para reinar sobre a vida de seus irmãos, inclusive sobre seu pai. Cremos que essa promessa o  sustentou durante os anos de sua mocidade. Ora, revelações são dadas para, normalmente, serem comunicadas. E, fiel a esse princípio, José falou dos seus sonhos, sem, porém, tentar oferecer-lhes a interpretação. Mas, com essa mensagem, que os irmãos ouviram e entenderam perfeitamente,  José foi ainda mais odiado. Novamente, ele não sentiu nada de diferente entre seus irmãos. (Gn. 37:5-11).
d)      José, um filho obediente. Apesar de ser o filho preferido, José tinha que trabalhar junto com seus irmãos, apascentando os rebanhos. Um dia, em casa, o pai lhe pediu que fosse a seus irmãos para ver como estavam passando, e, depois, trazer-lhe as noticias (Gn. 37:12-14). José, sem qualquer receio, obedeceu, nunca imaginando que os seus irmãos o odiavam e que seria traído por eles e vendido à escravidão. E assim aconteceu. Qual foi a reação de José? A Bíblia não fala. Porém, uma coisa é indiscutivelmente certa: José não perdeu o seu temor de Deus. O seu procedimento na escravidão demonstra a sua firmeza e confiança na sabedoria das providências de Deus. Certamente ele pensava à semelhança do Salmista: “Eu sou pobre e necessitado, porém o Senhor cuida de mim”. E, com esse consolo, fez uma oração espontânea ao Senhor: “Tu és o meu amparo e o meu libertador; não te detenhas, ó Deus meu!” (Sl. 40:17). 

2. Os Anos de Mocidade – até aos 30 anos. O temor de Deus não anula o sentimento de decepção. José não deixou que a circunstância negativa sacudisse a sua confiança no Deus que ele servia. Cremos que, de alguma forma, ele se firmou na certeza da presença sustentadora de Deus com uma promessa, tal como: “De maneira alguma, te deixarei, nunca jamais te abandonarei”. E, com essa verdade a encorajá-lo, ele respondeu: “Assim afirmemos confiantemente: o Senhor  é o meu auxílio, não  temerei; que me poderá fazer o homem?” (Hb. 13:5-6).

a)      José na casa de Potifar. Não sabemos como foram os primeiros tempos de José naquela casa. Mas uma coisa podemos facilmente reconhecer: Ele continuou, sem qualquer vacilação, deixando que o temor de Deus direcionasse a sua vida, porque a Bíblia registra: “O Senhor era com José, e veio a ser homem próspero; e estava na casa de seu senhor egípcio. Vendo Potifar que o Senhor era com ele e tudo o que ele fazia, o Senhor prosperava em suas mãos” (Gn. 39:2-3). José tornou-se tão abençoado pelo Senhor e, Potifar, querendo aproveitar dessa maravilha, promoveu esse escravo, “e tudo o que tinha confiou às mãos de José” (Gn. 39:6). Vamos, novamente, observar que José não deixou que essa prosperidade o fizesse abandonar o seu temor a Deus, antes, cremos que ele se firmou cada vez mais em seu propósito de ter uma vida santa e irrepreensível. Cristo explicou esta disposição, dizendo: “Assim brilhe também a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem o vosso Pai que está nos céus” (Mt. 5:16).
b)      José e a mulher de Potifar. “Aconteceu depois destas coisas, que a mulher de seu senhor pôs os olhos em José e lhe disse: Deita-te comigo” (Gn. 39:7). Parece que  essa foi a primeira tentação séria que José tinha que enfrentar. Não podemos subestimar o poder que acompanha o assédio sexual de uma mulher sensual. Mas, mediante um poder superior, o temor de Deus, José resistiu, dizendo: “Como, pois, cometeria eu tamanha maldade e pecaria contra Deus?” (Gn: 39:9). Continuar fiel no temor de Deus pode ser custoso. Por causa da vingança daquela mulher, José foi  lançado injustamente no cárcere, “ali ficou ele na prisão” (Gn. 39:20).
c)      José no cárcere.  Sofrer injustiças das mãos daqueles que deveriam nos apoiar é uma das tribulações mais difíceis de se suportar. Essa foi a segunda injustiça que José teve que enfrentar. Contudo, cremos que a sua reação foi semelhante àquela de Jesus Cristo: “Pois ele, quando ultrajado, não revidava com ultraje; quando maltratado, não fazia ameaças, mas entregava-se àquele que julga corretamente (1Pe. 2:23). Novamente, estamos vendo  como o temor de Deus nos ampara na tribulação. Os primeiros tempos no cárcere foram extremamente cruéis. O Salmista registrou: “Adiante deles (a família de Jacó) enviou um homem, José, vendido como escravo; cujos pés apertaram com grilhões e a quem puseram em ferros até cumprir-se a profecia a respeito dele, e tê-lo provado a palavra do Senhor” (Sl. 105:17-19). Imperceptivelmente, José estava sendo preparado para ser um salvador. Deus usou um método semelhante para preparar o seu próprio Filho para que pudesse ser o Salvador de todos aqueles que nele crêem. “Embora sendo Filho, aprendeu a obediência pelas coisas que sofreu e, tendo sido aperfeiçoado tornou-se o Autor da salvação eterna para todos os que lhe obedecem” (Hb. 5:8-9). Mas o Senhor jamais abandonou o seu servo fiel. “O Senhor, porém, era com José, e lhe foi benigno, e lhe deu mercê perante o carcereiro; o qual confiou às mãos de José todos os presos que estavam no cárcere; e ele fazia  tudo quanto se devia fazer ali. E nenhum cuidado tinha o carcereiro de todas as coisas que estavam nas mãos de José, porquanto o Senhor era com ele, e  tudo o que ele  fazia o Senhor prosperava” (Gn. 39:21-23). José estava na escola de Deus, que usava métodos estranhos para preparar o seu servo para uma responsabilidade maior. “Quem é fiel no pouco também é fiel no muito” (Lc. 16:10).    

3. Os Anos de Maturidade – até aos 110 anos, quando morreu. O temor de Deus e uma profunda comunhão com Ele são virtudes inseparáveis; existindo uma, sempre haverá a outra. “A intimidade do Senhor é para os que o temem, aos  quais ele dará a conhecer a sua aliança” – a sua vontade, (Sl. 25:14). Por causa dessa comunhão espiritual, José recebeu o dom de ser um administrador de confiança, seja na casa de Pontifar ou no cárcere. Deus estava preparando o seu servo para administrar o salvamento do Egito durante a grande seca.

a)      José como interprete de sonhos. O dom de interpretar sonhos é uma capacidade que vem de Deus, portanto, é Ele que tem que receber todo o crédito. Quando os dois prisioneiros, o copeiro-chefe e o padeiro-chefe lamentaram, dizendo a José: “Tivemos um sonho, e não há quem o possa interpretar”. Veja como José respondeu, dando testemunho da sua comunhão com o Deus verdadeiro: “Porventura, não pertencem a Deus as interpretações? Contai-me o sonho”. Sabemos que esses vieram de Deus e se cumpriram de acordo com a interpretação de José. Mas o copeiro-chefe imediatamente se esqueceu do pedido de seu benfeitor, (Gn. 40:6-23). Contudo, dois anos mais tarde, ele, repentinamente,  lembrou-se do bem que recebera de José, (Gn 41:1,9-13).  Cremos que Deus pode provocar um esquecimento, bem como trazer à memória um incidente que aconteceu no passado.
b)      José e o sonho do Faraó. Faraó também teve um sonho e, novamente, ninguém conseguiu lhe dar a interpretação. De repente, o copeiro-chefe lembrou-se de José e como ele podia interpretar sonhos. Com base nessa informação, José foi imediatamente chamado da prisão e, depois do devido preparo, foi apresentado ao faraó. Este, em sua impaciência, logo disse a José: “Tive um sonho e não há quem o interprete. Ouvi dizer, porém, a teu respeito que quando ouves um sonho, podes interpretá-lo”. Mas José logo o corrigiu e, dando toda a glória a Deus, disse: “Não está isso em mim; mas Deus dará resposta favorável a Faraó” (Gn. 41:15-16). Depois de ouvir a interpretação e a recomendação, o “conselho foi agradável a Faraó e a todos os oficiais. Disse Faraó a seus oficiais: Acharíamos, porventura, homem como este, em quem há o Espírito de Deus? Depois, disse Faraó a José: Visto que Deus te fez saber tudo isto, ninguém há tão ajuizado como tu. Administrarás a minha casa ( ... ) Vês que te faço autoridade sobre toda a terra do Egito” (Gn. 41:37-41). Foram necessários cerca de treze anos na escola de Deus para que José pudesse ser elevado a ser o governador sobre todo o Egito. Vamos entender que o temor de Deus, que nos sustenta durante todos os dias da nossa aprendizagem, nos concederá a vitória quando tivermos que colocar em prática o que temos aprendido. “E todas as terras vinham ao Egito para comprar de José, porque a fome prevaleceu em todo o mundo” (Gn. 41:57).
c)      José se encontra com seus irmãos. Novamente, observemos como o temor de Deus constrangeu as reações de José. Não há nenhum sinal de vingança nas determinações de José. Então, como podemos explicar o seu procedimento  para com os irmãos? Como em todas as circunstâncias de sua vida, ele foi cuidadoso para discernir as indicações do Espírito de Deus. Agora, diante de seus irmãos, o seu procedimento não poderia ser diferente. Como eles nunca tinham se arrependido de seu crime contra Deus e contra seu irmão, agora chegara a hora para fazê-los reconhecer e confessar o seu pecado. E Deus orientou José como usar uma estratégia  para produzir o tão necessário convencimento. Com os primeiros apertos, sem ouvir nenhuma alusão a seu crime, a consciência dos irmãos começou a trazer-lhes recordações específicas. “Então disseram uns aos outros: Na verdade, somos culpados, no tocante a nosso irmão, pois lhe vimos a angústia da alma quando nos rogava, e não lhe acudimos; por isso nos vem esta ansiedade” (Gn. 42:21). Sabemos que houve uma preciosa reconciliação entre os doze irmãos. A alegria de Jacó ao reencontrar seu filho amado foi muito comovente. O nosso Deus é o galardoador daqueles que nele crêem. Mas, vamos ouvir como José interpretou as suas experiências na presença de seus irmãos medrosos: “Não temais; acaso estou eu em lugar de Deus? Vós, na  verdade, intentastes o mal contra mim; porém Deus o tornou em bem, para fazer, como vedes agora,  que se conserve muita gente em vida. Não temais,  pois, eu vos sustentarei a vós outros e as vossos filhos. Assim, os consolou e lhes falou ao coração” (Gn. 50:19-21). O temor de Deus nos constrange a usar a magnanimidade para com os nossos irmãos faltosos.


Conclusão: Os princípios do temor de Deus que direcionaram a vida de José são dignos de serem imitados, se desejamos experimentar o mesmo êxito desse servo fiel a Deus. “Por isso, recebendo nós um reino inabalável, retenhamos a graça, pela qual sirvamos  a Deus de modo agradável, com reverência e santo temor, porque o nosso Deus é fogo consumidor” (Hb. 12:28-29). 

Rev. Ivan G. G. Ross
19 de Abril de 2016