Rev. Ivan G. G. Ross
Leitura
Bíblica: 1Timóteo 4:6-16;
Introdução: Em 1921, Casper Wisper Hodge escreveu: “Se
olharmos dentro do nosso próprio coração, podemos descobrir que a
concupiscência da carne, a concupiscência dos olhos e a soberba da vida estão, sorrateiramente,
se esforçando para reassumir o seu antigo domínio sobre a nossa vida”. E, nesse
contexto, o Apóstolo nos admoesta: “Tem cuidado de ti mesmo e da doutrina. Continua
nestes deveres; porque, fazendo assim, salvarás tanto a ti mesmo como aos teus
ouvintes” (V.16).
Nesse
versículo, duas verdades estão implícitas: primeira, a salvação dos nossos
ouvintes, bem como a nossa própria, depende da veracidade da doutrina recebida;
e, a segunda, os nossos ouvintes, bem como nós mesmos, perdemos a alegria da
salvação quando uma doutrina deficiente é ensinada e adotada. Tito foi exortado
a ficar “apegado à palavra fiel, que é segundo a doutrina, de modo que tenha
poder tanto para exortar pelo reto ensino, como para convencer os que o
contradizem” (Tt. 1:9).
Diante
desses dois perigos, o Apóstolo faz um apelo urgente: “Tem cuidado de ti mesmo
e da doutrina”. Por causa da tendência pecaminosa que ainda resta em cada um de nós, temos, por
exemplo: o pecado da leviandade, permitindo que as verdades divinas sejam
tratadas sem a devida seriedade; o pecado da indolência, quando o estudo da
Palavra não recebe a devida prioridade; o pecado do pragmatismo, quando os
resultados são mais importantes do que os meios utilizados. Uma Igreja cheia de
pessoas que não têm uma noção salvífica
do plano da salvação não redunde para a glória de Deus. Precisamos praticar um cuidado consciente com aquilo que estamos comunicando à Igreja,
para que seja de acordo com a sã
doutrina. Por causa de negligências no preparo das mensagens, é possível prejudicar aquele a favor de quem Cristo morreu (Rm. 14:15). Assim, percebemos
que a salvação dos nossos ouvintes também depende do nosso preparo teológico.
Seguindo o ensino do texto lido, escolhemos três disposições indispensáveis
para a formação da nossa vida teológica.
1.
A Importância da Piedade, Vs. 6-8. O nosso objetivo, como pastores, é este:
“Ser um bom ministro de Cristo Jesus, alimentado com as palavras da fé e da boa doutrina”. Eis a
exortação: “Exercita-te pessoalmente na piedade (...) a piedade para tudo é
proveitosa”. Piedade significa esforçar-se
para ser irrepreensível não somente diante de Deus, mas também do nosso próximo. Cornélio, em Atos 10, exercia a
sua piedade desta forma: era temente a
Deus e orava continuamente; ensinava a sua família a temer a Deus; cuidava do seu próximo fazendo
muitas esmolas ao povo; e cuidava da sua própria vida espiritual, pronto e
desejoso de ouvir a Palavra de Deus. Jó é outro exemplo dessa piedade, homem
íntegro, reto e que se desviava do mal (Jó. 1:1). E o nosso texto nos oferece
estas características de uma vida piedosa: “Torna-te padrão dos fiéis, na
palavra, no procedimento, no amor, na fé, na pureza”. O Apóstolo Paulo
desafiava os seus leitores, dizendo: “Sede os meus imitadores, como também eu
sou de Cristo” (1Co. 11:1).
Piedade
não é algo que surge sem a prática de hábitos regulares. Temos que nos aplicar
à leitura e ao estudo das Escrituras Sagradas, todos os dias, como um ato de
culto a Deus. A ordem é: “Exercita-te, pessoalmente, na piedade”. O Apóstolo
Pedro nos encoraja: “Empenhai-vos por serem achados por ele em paz, sem mácula
e irrepreensíveis” (2Pe. 3:14). Temos que aprender a praticar a abnegação:
“Desembaraçando-vos de todo peso (coisas desnecessárias que impedem o nosso
livre desempenho na prática da vontade de Deus) e do pecado que tenazmente nos
assedia, corramos com perseverança a carreira que nos está proposta” (Hb.
12:1). Temos que ser cuidadosos com as nossas amizades e com o que ouvimos e
falamos, lembrando-nos da advertência: “Não vos enganeis: as más conversações
corrompem os bons costumes” (1Co. 15:33). Até certo ponto, ninguém fica ileso
da influência negativa da convivência
moderna, pois ela pode opacificar o nosso testemunho cristão. Repetimos a
urgência do apelo do Apóstolo: “Tem cuidado de ti mesmo e da doutrina”. Tem
cuidado para praticar uma vida piedosa. E qual o proveito de exercitar-nos na
prática dessa piedade? Ela “tem a promessa da vida que agora é e da que há de vir”.
A promessa de comunhão espiritual com Deus; o amor de Deus derramado em nosso
coração pelo Espírito Santo; e a paz de Deus que excede todo o entendimento,
não apenas para o presente, mas, sim, para toda a eternidade.
2.
A Importância de Singularidade, Vs. 9-12. Singularidade no exercício do
ministério, uma ação que não pode ser compartilhada com as filosofias modernas.
“Ordena e ensina estas coisas”, coisas
bíblicas. Observem os dois verbos: ordenar e ensinar. Ordenar significa impor
com autoridade, uma autoridade que
provém da clara exposição das Escrituras Sagradas. Ordenar é impedir a
circulação de “fábulas profanas”;
proibir a entrada de “espíritos enganadores e o ensino de demônios”. Parece que
o Apóstolo estava prevendo os tempos modernos! A Igreja não pode ser permitida
a cultivar a mentalidade dos atenienses. “Pois todos os de Atenas, e os
estrangeiros residentes, de outra coisa não cuidavam senão dizer ou ouvir as últimas
novidades” (At. 17:21). Ensinar é colocar o material em ordem sistemática para
que as propostas sejam devidamente assimiladas e praticadas pelos ouvintes.
Esse modo de ensinar é de suma importância
para que a Igreja tenha “as suas faculdades exercitadas para discernir
não somente o bem, mas também o mal” e o que fere os ensinos bíblicos, (Hb.
5:14). Ensinar para que Igreja possa
discernir a diferença entre os conceitos
populares e as verdades bíblicas que comunicam a vida eterna. E, para isso, é
necessário alimentar a Igreja “com as palavras da fé e a boa doutrina”. Temos
que confiar no poder efetível da
Escritura Sagrada. Por meio dela, Deus realiza todos os seus propósitos entre
os homens.
É
importante tomar conhecimento das cinco “palavras fiéis” que se encontram
nas “Cartas Pastorais”: (1Tm. 1:15; 3:1; 4:8-9; 2Tm 2:11-13; Tt 3:4-8). Elas
são súmulas de verdades e princípios bíblicos. Veja V.9 da nossa leitura: “Fiel
é a palavra e digna de inteira aceitação”. Qual é essa palavra fiel? Aquela do
V.8, que fala sobre a particularidade de uma vida piedosa. “Pois o exercício físico para pouco é proveitoso, mas a piedade
para tudo é proveitosa, porque tem a promessa da vida que agora é e da que há
de ser”. O servo de Deus não pode ser contador de lorotas jocosas quando deve
estar explicando as Escrituras Sagradas. Ele tem que ser totalmente singular em
suas atitudes diante de Deus. Às vezes os pastores são criticados por causa de
seu modo irreverente para apresentar a sua mensagem. Ele não é um animador de
emoções, antes, tem que ser inteiramente singular em suas atitudes espirituais,
um “obreiro que não tem de que se envergonhar, que maneja bem a palavra da verdade” (2Tm. 2:15). Sem essa
singularidade na prática da piedade, o pastor perde a sua autoridade no ensino
da palavra, e, pior ainda, o nome de Deus é blasfemado em pleno culto público,
por causa dessa insensibilidade espiritual. O salmista cultivava a atitude
correta: “arrepia-me a carne com temor de ti, e temo os teus juízos” (Sl.
119:120).
3.
A Importância da Biblicidade, Vs. 13-16. No V.13, temos os três elementos
indispensáveis no culto público: Reconhecemos que existem outros, mas, aqui, o Apóstolo está
ressaltando estes três. “Aplica-te à leitura”. Não esquece o lugar das
Escrituras Sagradas no Culto a Deus. Qual
a razão dessa ênfase? Reconhecemos que o único contato que muitas pessoas das
nossas Igrejas têm com a Palavra de Deus, é o que ouvem nos cultos dominicais,
visto que poucas lêem a Bíblia diariamente em culto doméstico. Portanto, nessas
leituras públicas, os ouvintes devem se sentir exortados pelo que Deus
está dizendo sobre as suas vidas morais e espirituais.
Além disso, o povo tem que receber o ensino que conduz ao conhecimento da
natureza de Deus e ao que Ele requer de
cada um de nós. Devemos lembrar que o
fim principal do culto público é que Deus seja glorificado e que a Igreja seja
encaminhada, encorajada e fortalecida para viver uma vida santa e
irrepreensível, uma vida que revela a realidade de Cristo em nós. Um exemplo
prático desse culto se encontra em Neemias 8:5-8: “Ezdras abriu o Livro à vista
de todo o povo (...). Leram no Livro, na lei de Deus, claramente, dando
explicações, de maneira que entendessem o que se lia”. Creio que essas
explicações foram interpoladas durante a leitura. E quando palavras técnicas,
tais como justiça, redenção, perdão e santificação foram encontradas, um breve
esclarecimento de cada uma foi dado.
No V.14,
o pastor é incentivado a reavivar o dom que Deus lhe deu para pastorear o seu
rebanho. O uso da frase, “não te faças negligente”, significa uma consagração
diária, dizendo: “Eis aqui estou para fazer, ó Deus, a tua vontade” (Hb. 10:9).
Essa consagração se torna ainda mais necessária, pois o dom foi reconhecido
publicamente “com a imposição das mãos do presbitério”.
No
V.15, temos que ser diligentes quanto ao cuidado da nossa vida espiritual, para
que o nosso crescimento “a todos seja manifesto”. Temos que “crescer na graça e
no conhecimento de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo” (2Pe. 3:18). Por que a
ênfase sobre esse desenvolvimento espiritual? Eis uma resposta que o Apóstolo
nos deu: “Para que tendo pregado a outros, não venha eu mesmo a ser
desqualificado” (1Co. 9:27). O Pastor tem que tornar-se “padrão dos fiéis” em
termos de diligência, cuidando para que a sua diligencia espiritual seja observada por todos.
No
V.16, temos mais uma exortação e, com esta, uma promessa encorajadora foi
anexada. Quando atendemos ao conteúdo desse conselho, a promessa será cumprida.
É evidente que o pastor que não sabe como cuidar da sua própria vida espiritual
não estará apto para pastorear a vida de outros. Nesse contexto, temos a
admoestação: “tem cuidado de ti mesmo e da doutrina”. Cuidar de nós mesmos
significa que temos que selecionar os livros (ou o que se encontra na
Internet), que devem alimentar, positivamente, a nossa vida espiritual. O
Apóstolo nos faz lembrar: “um pouco de fermento leveda toda a massa” (Gl. 5:9).
Ou a advertência: “Não vos enganeis: as más conversações corrompem os bons
costumes” (1Co. 15:33). Por causa do pecado que ainda resta em nós, podemos ser
influenciados pelo alimento que não produz o temor de Deus e nem uma vida santa
e irrepreensível. E, quando o pastor está sendo influenciado negativamente, ele
oferecerá o mesmo alimento à sua Igreja para a debilitação daqueles “a favor de
quem Cristo morreu” (Rm. 14:15) Mas, por outro lado, se ele cuidar da sua própria
vida espiritual com livros (ou o que se encontra na Internet), cuidadosamente
escolhidos, terá a experiência da promessa: “Salvará tanto a si mesmo como aos
seus ouvintes”.
“Ai
dos pastores que destroem e dispersam as ovelhas do meu pasto! – diz o Senhor”
(Jr. 23:1). Portanto, temos que cultivar “o mesmo sentimento que houve também
em Cristo Jesus”, que disse: “Eu sou o bom pastor. O bom pastor dá a vida pelas
ovelhas” (Fp. 2:5; Jo. 10:11). Então, qual é o nosso dever, dia após dia?
“Procura apresentar-te a Deus aprovado, como obreiro que não tem de que se
envergonhar, que maneja bem a palavra da verdade” (2Tm. 2:15).
Conclusão:
Terminamos confessando que o pastor tem o ofício mais sublime que um homem
mortal pode exercer: ministrar em Nome do Senhor. Porém, isso envolve uma
responsabilidade quase insuportável, fazendo o Apóstolo exclamar: “Quem, porém,
é suficiente para estas coisas?” (2Co. 2:16). Por que este ministério
compreende tamanha responsabilidade? Porque estamos direcionando vidas, vidas
imortais que podem passar a eternidade, ou no céu ou no inferno. Mas a
sublimidade do ministério do pastor é que ele é encarregado de pregar o
evangelho, a mensagem que conduz pecadores a arrependerem-se e a entregarem-se
a Jesus Cristo, de quem recebem o perdão de todos os seus pecados, juntamente
com a promessa de vida eterna.
Por
isso, o nosso ministério tem que ser caracterizado por uma piedade pessoal,
servindo de modelo, tendo uma vida moral e espiritual irrepreensível diante de
Deus. Temos que praticar uma singularidade em nosso ministério, sem qualquer
mistura com conceitos populares, pois o nosso objetivo é ordenar e ensinar o
Nome santo do nosso Deus. Temos que praticar uma biblicidade que edifica não
apenas a nossa própria vida, mas também a vida do povo de Deus que depende da
nossa fidelidade às Escrituras Sagradas. O Ap. Paulo nos deixa com a palavra
final: “Expondo estas coisas aos irmãos serás bom ministro de Jesus Cristo”.
Amém
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